Dificuldade para identificar um doador em potencial e a fragilidade do pulmão faz com que apenas 5% dos órgãos sejam transplantados
O Brasil tem a maior rede pública de transplantes e vem registrando um aumento gradativo no número de cirurgias. De acordo com a coordenadora do Sistema Nacional de Trasplantes, Rosana Nothen, apesar da tendência de aumento desde 2006, o número de doadores efetivos é de 8,6 para cada um milhão de habitantes. Na Espanha, esse número chega a 36 por milhão de habitantes.
Em relação ao transplante de pulmão, o médico assistente do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Incor) e professor da Universidade de São Paulo (USP), Paulo Pego Fernandes, explicou que ainda é uma cirurgia relativamente nova no mundo e muito recente no Brasil.
"Tem aumentado, mas ainda é um número baixo. Tem espaço para crescer. Temos feito várias iniciativas, e uma delas é divulgar mais. Fazer o médico lembrar que o paciente dele pode ser um candidato a doador, o próprio paciente e os familiares pensarem nisso."
A média de aproveitamento dos pulmões para transplantes no Brasil é de apenas 5%, enquanto no restante do mundo chega a 10% ou 15%. Dois fatores interferem diretamente nesse baixo índice: a dificuldade para identificar um doador em potencial e a fragilidade do órgão.
Segundo o médico, de todos os órgãos sólidos transplantados, o pulmão é o único que tem contato direto com o meio ambiente e por isso fica muito mais exposto a infecções do que o rim, o fígado e o coração.
Outro problema, segundo Fernandes, é a maior incidência de traumas no Brasil em relação a países mais desenvolvidos, onde a grande maioria dos doadores são vítimas de derrame e morte cerebral. "Esse tipo de morte oferece menos trauma do que um acidente de motocicleta, carro, um tiro.
Ele observa, ainda, que há dificuldades no momento em que a pessoa é atendida, especialmente no que se refere aos cuidados para que não ocorra infecção no pulmão desse paciente e possível doador.
No Incor, 60 doentes estão na fila de espera por um pulmão. Em 2008 foram realizados 23 transplantes. "Seria uma fila de espera para 3 anos. O tempo está em 18 meses, o que é relativamente alto", disse Fernandes.
Para tentar mudar essa realidade e a captação de órgãos, o Incor realizou em novembro um curso para orientar os profissionais de cidades do interior a identificar melhor os possíveis doadores.
Os pré-requisitos básicos para que o pulmão seja doado são a ausência de pneumonia, não estar broncoaspirado (quando o paciente regurgita e aspira) e não ter infecção em outro órgão. Além disso, o paciente não pode ser muito idoso e deve ter a pressão arterial razoável, com condições circulatórias adequadas.
De acordo com dados da Secretaria de Saúde de São Paulo, até outubro foram registrados 543 doadores viáveis no estado - que tiveram um ou mais órgãos aproveitados para transplantes -, o que representa 11,7% a mais do que o registrado no ano de 2008, quando foram contabilizados 486 doadores.
No mesmo período, os dados mostram que foram realizados 77 transplantes de coração, 98 de pâncreas, 801 de rim, 443 de fígado e 24 de pulmão.
Segundo Fernandes, a sobrevida depois do transplante de pulmão é de 70 a 80% ao final de um ano e de 50 a 60% ao final de cinco anos. "Isso levando em consideração que, sem o transplante, nenhum desses pacientes sobreviveria nesse período de cinco anos."
A indicação para o transplante vai para pacientes com doenças muito graves não infecciosas nem câncer. "É o doente com enfisema, fibrose cística, fibrose pulmonar que está sendo tratada, mas que piora apesar do tratamento. Então ele tem uma qualidade de vida muito ruim e uma perspectiva de vida também ruim."
Uma das novas regras para os transplantes, anunciadas no final de outubro pelo Ministério da Saúde, é o benefício dado a crianças e adolescentes na fila. A partir de agora, eles terão preferência na hora de receber órgãos de doadores da mesma faixa etária.
De acordo com o Ministério da Saúde, no primeiro semestre de 2009 em relação ao mesmo período de 2008, o transplante de rim aumentou 30,28% e o de fígado, 23,17%. No entanto, no mesmo período, os transplantes de coração e de pulmão - que têm mais dificuldades na captação e manutenção dos órgãos - caíram 20,4% e 15,38%, respectivamente.